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Diz a letra de “Nos bailes da vida que todo artista tem de ir aonde o povo está”. Ciente disso – afinal, é ele um dos autores da música, em parceria com Fernando Brant –, o cantor e compositor Milton Nascimento foi ao encontro do povo na Praça Barão do Rio Branco, em Vitória da Conquista, no último sábado, 21, como a principal atração da quarta noite do Natal da Cidade. O espetáculo contou com participação especial do maestro e arranjador Wagner Tiso, que, momentos antes, havia subido ao palco para um show instrumental ao lado do guitarrista e violonista Victor Biglione.
Após 59 shows realizados ao longo de 2013 – inclusive em alguns países da Europa –, que compuseram sua turnê “Travessia”, por meio da qual revisitou vários momentos de seus cinquenta anos de carreira, o cantor e compositor realizou, no evento natalino organizado pela Prefeitura Municipal, sua 60ª e última apresentação do ano. Em praça pública, como é a lógica do Natal da Cidade. E, talvez por isso, o artista tenha protagonizado, durante o espetáculo, alguns daqueles momentos, cujas sensações somente os que viveram são capazes de descrever.
“Acho o maior barato. Geralmente, esse negócio de gente de toda espécie de música, de tudo o que acontece, é o que o Brasil precisa e é o que o Brasil tem. Então, fico feliz de estar aqui”, disse, durante a breve entrevista que concedeu antes de subir ao palco. Milton fala pouco, tanto antes quanto durante o show. Tem absoluta ciência da magnitude do tesouro que carrega em suas cordas vocais e, por isso, parece utilizá-lo somente o mínimo necessário. Reserva-o para os momentos em que está no palco e é capaz de emocionar as pessoas. Nisso, ele foi absolutamente feliz durante sua apresentação no Natal da Cidade.
O público, que no início parecia não crer no que lhe estava diante dos olhos, foi aos poucos se habituando à ideia de que ali, diante dele, quem cantava era mesmo Milton Nascimento, um dos mais talentosos e reconhecidos cantores e compositores da música popular brasileira. E que aquela voz que ecoava por toda a extensão da Praça Barão do Rio Branco saía, sim, de um senhor de carne e osso, de 71 anos de idade, que, para mostrar sua genialidade, não precisa falar. Basta-lhe cantar. É isso o que ele tem feito há pelo menos cinquenta anos.
‘Canção da América’ – Milton sabe que, em alguns momentos, é necessário conversar com quem o está ouvindo. E, até nesses momentos, ele mantém aquilo a que se convencionou chamar de “presença de espírito”. A certa altura, sentou-se e comentou sobre a “Canção da América”, uma de suas músicas mais conhecidas pelo público. Bem-humorado, reconheceu que a excessiva utilização da canção levou-o a evitá-la por algum tempo. “Ela serve para tudo”, brincou, referindo-se ao fato de as pessoas valerem-se da canção como trilha sonora para momentos diversos, desde formaturas até confraternizações entre amigos.
Qualquer artista talvez ignorasse a canção, ou talvez a cantasse de uma forma diferente, recorrendo ao público em alguns momentos. Mas Milton, definitivamente, não é qualquer um. “Quero que vocês a cantem para mim”, pediu, delicadamente. No início, o público não tomou nota da responsabilidade da tarefa a que havia sido instado. Mas, refeito da surpresa, começou a entoar, em uníssono, os primeiros e famosos versos: “Amigo é coisa pra se guardar…” A partir daí, teve início aquele que foi um dos mais belos momentos de toda a história do Natal da Cidade.
Rostos molhados – Enquanto o público cantava, Milton, sentado, ouvia de olhos fechados, como que a saborear o resultado da própria genialidade. Indiferentes à chuva que insistia em cair, as pessoas obedeciam ao ídolo e avançavam, verso por verso. Rostos molhados pontuavam em vários cantos da plateia, tornando-se impossível, a certa altura, distinguir se o que os ensopava era a chuva ou o fato de não conseguirem conter as lágrimas. Até que se chegou ao fim da canção. Milton aplaudiu. E o público, em seguida, também explodiu em aplausos efusivos – talvez sem perceber que, ali, aplaudia a si mesmo, com a aprovação do ídolo.
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